O preço da inocência
Zilef era uma crinaça de 6 anos que tinha tido o azar de nascer num daqueles países pobres em constante guerra civil.
O esforço de guerra por parte das facções era tal que todos os meios possiveis eram usados, daí ter ouvido, numa conversa entre os pais e familiares, que até as caricas valiam ouro. A sua procura era devido ao facto de serem recicladas para a produção de balas, as balas que depois sussurram o fim da vida e semeiam a destruição.
A guerra passava um bocado ao lado de Zilef, mas sabia que já tinha perdido 3 irmãos e muitos familiares às mãos daquele comboio de desgraças.
Sempre habituado a viver na mais profunda miséria, Zilef tinha um sonho que acalentava há muito tempo: ter um brinquedo como deve de ser, comprado numa loja normal e não apenas feito de restos de detritos atirados para o lixo pelas outras pessoas. Queria um brinquedo seu e que brilhásse. Mas era pobre e não tinha dinheiro, nem os pais lho dariam, pois já mal conseguiam sobreviver, no meio de tanta miséria e de tantos tiros.
Não tinha dinheiro mas, depois de ouvir a conversa dos pais com os familiares, sabia como conseguir comprar o brinquedo. No meio de tanta pobreza em que vivia não era dificil recolher uma saca cheia de caricas, entre os campos de lixeiras onde fazia as suas guerras de brincadeira, onde brincava ao apanha, ou jogava à bola com um monte de trapos velhos enrolados. Onde a doença andava de mãos dadas com a felicidade de crianças que se sentem livres para brincar, nem que seja por pequenos instantes até se ouvir a próxima rajada de tiros.
Zilef juntou caricas até encher uma velha saca de pano que encontrou também, no meio dos detritos alheios, e foi à loja mais próxima que se lembrou que existia.
Olhou e olhou para todos os brinquedos e parou perante o brilho em tons prateados de uma linda pistola de brincadeira, ao estilo dos cowboys e índios, que tantas vezes fazia parte das suas brincadeiras. Estava decidido, era aquele o brinquedo perfeito.
Chegou-se junto ao balcão e mostrando apenas a cabeça ao dono da loja pediu a pistola de brincadeira. O dono da loja entregou-a e disse o preço. Zilef agarrou na saca maltratada pelo tempo ou simplesmente pelos antigos donos que a jogaram fora, colocou em cima do balcão e respondeu "Bem, o meu pai disse que é ouro". O homem pegou na saca, abanou e ouviu o tilintar do metal. Aquele som despertou-lhe a ganancia e abriu-lhe um largo sorriso deixando bem evidentes dois dentes de ouro, um de cada lado da boca. "Está certo", disse sem conferir. Certamente estava ali uma fortuna bem maior que o preço do brinquedo, e uma criança tão nova nunca saberia se tinha direito a troco ou não.
Zilef tomou então o caminho de casa, feliz da vida com o seu brinquedo novo... com a sua pistola.
A meio do caminho começa um tiroteio entre as duas facções rivais do país e Zelif encontra-se bem no meio da rua. Lembra-se então dos irmãos que perdera e é nesse momento que pega na sua pistola reluzente e ergue-a bem alto e grita "Parem!".
Por momentos faz-se silêncio e o Sol desperta o prateado da pistola de brincadeira.
É nesse instante que uma bala sussura-lhe ao ouvido: "É o fim..."
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