segunda-feira, agosto 09, 2010

Promontório




Deixaste-me estragado. Fizeste-o inconscientemente, mas fiquei estragado.
Queria escrever de ti e não sei como o fazer. Era problema que não tinha no passado e agora não encontro as palavras certas. É como se o Mundo não estivesse preparado para que te tivesses atravessado no meu caminho e não tivesse ainda inventado um dialecto e as palavras necessárias que te fizessem justiça. E eu não consigo encontrar nem inventar essas palavras que não existem e que agora tanta falta me fazem… e sinto-me estragado, avariado, sem conserto possível.
Faço-me então ao caminho, tendo por objectivo voltar ao ponto onde tudo terá começado e onde o Mundo conhecido termina…


Quando começar a atravessar o promontório direi apenas o teu nome, sabendo de antemão que os rochedos o guardarão em segredo absoluto, mesmo sem existir um dialecto que te consiga definir em palavras… mas os rochedos saberão perfeitamente o que pretendo dizer - conhecem-te tão bem ou melhor do que a mim - e concordarão comigo, à medida que as ondas se abatem violentamente, lá em baixo, trazendo gotas de água à minha face para camuflar o sal das minhas lágrimas.


Chegando ao fim do promontório já nada haverá a dizer, bastou ter dito o teu nome uma vez para não haver mais utilidade às palavras. Junto à ravina, com as ondas a atirarem-se contra as rochas em sucessivos rituais suicidas, esperarei o sinal que há muito procuro com a certeza de que o segredo do teu nome estará bem guardado para sempre. E os rochedos lembrar-me-ão que o Homem não foi feito para viver junto às nuvens, não foi feito para voar.


E, com essa lembrança bem presente, darei um último suspiro a esse vento de sabores oceânicos, abrirei os braços em súplica e desespero – como um jovem pássaro que se prepara para se aventurar pela primeira vez fora do ninho - e, num passo único em direcção ao céu, darei um eterno abraço ao mar.






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