Antemanhã adentro
A imagem não é propriamente como pretendido, mas... é excelente.
Cinco horas da manhã. O céu está limpo, como seria de esperar numa noite de fim de Junho, mas uma leve aragem fria percorre a espinha, apresentando-se como uma ameaça impensável de que o Verão se tivesse esquecido desta parte do Universo e o Outono se lhe antecipava sem pensar duas vezes. Uma noite que deveria fazer lembrar que o Verão no Algarve costumava começar em Abril ou Maio mas que este ano decidiu adiar-se por tempo ainda indeterminado.
Se noutros tempos o ambiente temulento e contagiante de uma noite mais desvairada emprestaria uma sensação flutuante aos passeios das ruas velhas da cidade, nos tempos que agora correm - e depois de aprender com erros do passado, mas ainda bem presentes na memória - as pernas pesam de um cansaço que as duas últimas horas de refrigerantes e aguas impediram de camuflar e os passos lentos lembram o arrastar de toneladas de pensamentos.
As ruas encontram-se quase desertas. Aqui e ali um ou outro grupo mais alegre - ou mais destruído pelas forças de Baco - vão fazendo algum barulho no seu périplo até suas casas. Junto à doca, os bancos de jardim desertos aparecem iluminados pelo meu nome, enquanto vou esgrimindo razões que não o são, para decidir que rumo tomar. Por entre os barcos nota-se o imperfeito espelho das águas da ria, ligeiramente tremulas devido à fria aragem que me colhe pelas costas.
O que impede neste momento, em que me encontro só e sentado num banco de jardim em plena madrugada, de que apareça um qualquer marginal de lâmina justiceira na mão a reivindicar uma qualquer moeda que tenha ficado esquecida no fundo dos meus bolsos…? Nada. Tal como todas as circunstancias e coincidências que fazem com que tudo aconteça. Tanto pode acontecer como pode não acontecer. Da mesma forma que a minha reacção depende das escolhas que faça nesse instante. A guerra interna entre dar-lhe as moedas ou preferir arriscar um golpe cujas consequências futuras sabem-se lá quais são…
Da mesma forma que pode aparecer um qualquer gang à procura de telemóveis. Dando os telemóveis, seria isso impedimento para que partissem para a agressão, deixando-me sabe-se lá em que estado…
Mas as coincidências têm que forçosamente ser sempre más. Porque, por determinação da posição dos astros ou o que quer que seja que comando os cordelinhos das coincidências, pode até dar-se o caso de passar uma mulher linda, daquelas que pensamos em levar a apresentar à família no dia seguinte.
E nesse instante as opção são várias – e nisso não há conjugação de planetas que tenha voto na matéria – desde simplesmente fazer de conta que não se viu ou dizer-lhe um “boa noite” que a levasse - por capricho divino ou capricho feminino, que vai dar precisamente ao mesmo - a sentar-se ao meu lado no banco, com um sorriso, enquanto em mim dispara alucinante e a uma velocidade exponencial a ânsia de lhe ouvir a voz.
“São 45 euros, jeitoso.”
…bem fiz eu ao não sair sequer de casa.
Cinco horas da manhã. O céu está limpo, como seria de esperar numa noite de fim de Junho, mas uma leve aragem fria percorre a espinha, apresentando-se como uma ameaça impensável de que o Verão se tivesse esquecido desta parte do Universo e o Outono se lhe antecipava sem pensar duas vezes. Uma noite que deveria fazer lembrar que o Verão no Algarve costumava começar em Abril ou Maio mas que este ano decidiu adiar-se por tempo ainda indeterminado.
Se noutros tempos o ambiente temulento e contagiante de uma noite mais desvairada emprestaria uma sensação flutuante aos passeios das ruas velhas da cidade, nos tempos que agora correm - e depois de aprender com erros do passado, mas ainda bem presentes na memória - as pernas pesam de um cansaço que as duas últimas horas de refrigerantes e aguas impediram de camuflar e os passos lentos lembram o arrastar de toneladas de pensamentos.
As ruas encontram-se quase desertas. Aqui e ali um ou outro grupo mais alegre - ou mais destruído pelas forças de Baco - vão fazendo algum barulho no seu périplo até suas casas. Junto à doca, os bancos de jardim desertos aparecem iluminados pelo meu nome, enquanto vou esgrimindo razões que não o são, para decidir que rumo tomar. Por entre os barcos nota-se o imperfeito espelho das águas da ria, ligeiramente tremulas devido à fria aragem que me colhe pelas costas.
O que impede neste momento, em que me encontro só e sentado num banco de jardim em plena madrugada, de que apareça um qualquer marginal de lâmina justiceira na mão a reivindicar uma qualquer moeda que tenha ficado esquecida no fundo dos meus bolsos…? Nada. Tal como todas as circunstancias e coincidências que fazem com que tudo aconteça. Tanto pode acontecer como pode não acontecer. Da mesma forma que a minha reacção depende das escolhas que faça nesse instante. A guerra interna entre dar-lhe as moedas ou preferir arriscar um golpe cujas consequências futuras sabem-se lá quais são…
Da mesma forma que pode aparecer um qualquer gang à procura de telemóveis. Dando os telemóveis, seria isso impedimento para que partissem para a agressão, deixando-me sabe-se lá em que estado…
Mas as coincidências têm que forçosamente ser sempre más. Porque, por determinação da posição dos astros ou o que quer que seja que comando os cordelinhos das coincidências, pode até dar-se o caso de passar uma mulher linda, daquelas que pensamos em levar a apresentar à família no dia seguinte.
E nesse instante as opção são várias – e nisso não há conjugação de planetas que tenha voto na matéria – desde simplesmente fazer de conta que não se viu ou dizer-lhe um “boa noite” que a levasse - por capricho divino ou capricho feminino, que vai dar precisamente ao mesmo - a sentar-se ao meu lado no banco, com um sorriso, enquanto em mim dispara alucinante e a uma velocidade exponencial a ânsia de lhe ouvir a voz.
“São 45 euros, jeitoso.”
…bem fiz eu ao não sair sequer de casa.